Dislexia não é distúrbio e sim parte da evolução cultural da espécie, diz estudo
A dislexia não deveria ser considerada um distúrbio, e sim uma diferença comportamental e cerebral, segundo cientistas da Universidade de Cambridge. A conclusão parte da análise de uma série de estudos em cognição, comportamento e cérebro que mostram uma especialização em explorar o desconhecido e observar o quadro geral das coisas por parte dos disléxicos.
As vantagens trazidas pelo cérebro disléxico podem ter evoluído à medida que os humanos se adaptavam a um ambiente em constante mudança: para sobreviver, nós, humanos, precisávamos aprender novas habilidades e adquirir hábitos, mas também ser criativos e encontrar soluções inovadores através da exploração. O estudo sobre a dislexia foi publicado na revista Frontiers in Psychology.
Entendendo a dislexia
Em sua pesquisa, os cientistas Helen Taylor e Martin Vestegaard dizem que, já que o cérebro tem capacidades limitadas, a única maneira de melhorar a adaptação ao ambiente seria se especializando em estratégias diferentes. Algumas pessoas ficaram melhores em utilizar os conhecimentos adquiridos, enquanto outras focavam mais na descoberta e inovação.
Eles também consideram que, em muitos campos de pesquisa, entende-se que sistemas adaptativos, como organizações, o cérebro ou até mesmo uma colmeia, é necessário um equilíbrio entre o explorar e o aproveitar, para que a adaptação e sobrevivência funcionem bem. O cérebro disléxico, então, se encaixa nesse entendimento, tendo vantagens e desvantagens.
Aprender a ler, escrever ou tocar piano são aprendizados que dependem de uma memória procedural, ou seja, essas habilidades são processadas automática e rapidamente — mas a automatização da tarefa dita que o indivíduo utiliza a mesma informação uma vez após a outra.
Se a pessoa, no entanto, tem dificuldade para automatizar tarefas, ela fica consciente de todo o processo. A vantagem dela é que a habilidade ou o processo podem ser melhorados e a exploração da atividade pode continuar. A visão negativa que temos da dislexia considera que nossos processos de aprendizado são baseados em repetição e automatização de tarefas, e é por isso que a condição é chamada de distúrbio do aprendizado ou do desenvolvimento.
Segundo os cientistas, o nosso processo educativo e a importância da leitura e escrita em nossa cultura acabam gerando essa visão negativa da dislexia. Examinando estudos anteriores em psicologia e neurociência, os pesquisadores notaram as diferenças de formação do cérebro disléxico.
O cérebro organiza seus neurônios de forma diferente quando ele é melhor em ver o quadro geral das coisas em comparação ao cérebro que é mais orientado a detalhes. Pessoas disléxicas têm conexões mais longas e menos conexões locais. Como esses modos de pensar evoluíram em conjunto, eles funcionam melhor de forma colaborativa: juntar os dois tipos diferentes de cérebro gera um resultado melhor do que dois cérebros iguais ou mais.
Como incluir os disléxicos?
Pensar na dislexia como uma diferença ao invés de um distúrbio poderia fazer com que a sociedade se beneficiasse de soluções mais inovadoras, segundo os cientistas. Os disléxicos passam por muitas dificuldades em nosso mundo, mas apenas porque o ambiente foca em uma forma de aprendizado que não faz sentido para eles.
Focar no aprendizado por descobertas, invenções e criatividade pode ser a chave para trazer seus pontos fortes à tona. Ainda é possível ser um ótimo cirurgião tendo dificuldades com leitura e escrita, mas essa oportunidade pode se perder se o indivíduo não consegue passar nas provas tradicionalmente elaboradas nas universidades. Essas barreiras à dislexia precisam ser quebradas, concluem os pesquisadores.
(Fonte: Canaltech)