Sem medo de trabalho, João recomeça aos 69 como “destaque do mês” em fast food

Aos 69 anos, José deixou a aposentadoria de lado e recomeçou a vida com emprego em Fast Food (Fotos: Kimberly Teodoro)

Mãos inquietas acostumadas ao volante de caminhão e olhos atentos de quem está sempre em movimento, são as principais características de João Peruche Neto, que depois de aposentado, aos 69 anos decidiu voltar a estudar e trocou o merecido descanso por um novo começo como atendente em rede de fast food famosa, no meio da molecada.

Bem disposto e sem medo de trabalho, João caminha 6 quadras de casa até o Terminal Guaicurus, onde pega o ônibus das 8h para o shopping, um trajeto que pode levar até 40 minutos. “Tem vezes que eu venho em pé, dependendo da lotação. Mas me orgulho de nunca ter me atrasado na hora de bater o ponto na empresa”, comenta.

Ele entra às 9h da manhã durante a semana e só saí às 17h, bem a tempo de ir para a Escola Municipal Professora Iracema de Souza Mendonça, na região do Bairro Universitário, onde recém concluiu o 6º ano do Ensino Fundamental, com notas que, segundo ele, ficaram entre 8 e 10.

Com 3 filhos já criados e 3 netos, João vive com a esposa em Campo Grande há 5 anos, cidade para onde veio em busca de novas oportunidades depois da aposentadoria. Hoje é o único responsável pelo sustento da casa. A decisão de voltar ao trabalho é a junção da necessidade do caminhoneiro que viu a renda familiar cair para apenas 1 salário mínimo por mês, sem que as contas da casa diminuíssem. Mas o tempo ocioso também pesou.

O barulho constante na estrada fez com que João perdesse parte da audição, o que não impediu que procurasse novamente um lugar no mercado de trabalho. Hoje, no o registro da carteira a nova profissão consta como “atendente de restaurante”, função para a qual João foi contratado há 8 meses. Nesse tempo, conquistou por 2 vezes o título de “destaque do mês”, como melhor funcionário da loja do Mc Donald’s no Shopping Campo Grande.

Durante os primeiros meses, o trabalho de João se resumia a retirar as bandejas deixadas pelos clientes na praça de alimentação, organizar e limpar as mesas dentro do espaço reservado à lanchonete. Mas de acordo com ele, havia muito pouco a aprender ali, por isso ele pediu a encarregada do RH para começar a atender os clientes na entrega dos pedidos, onde a concentração é grande.

Os colegas de trabalho relatam receber muitos elogios direcionados a ele, de gente que mesmo depois de comer ainda volta no caixa para falar bem de João, que normalmente, fica sem graça.

São horas de trabalho em pé, lidando com o público e andando de um lugar para o outro, sempre procurando ser útil e sem nenhuma reclamação. Ele disse já ter tido dois empregos, antes de chegar ao fast food, mas a idade fez com que fosse dispensado dos dois. Para ele as pessoas ainda têm muito preconceito na hora de contratar um idoso, ainda mais para quem estudou muito pouco durante a vida.

Por isso, todos os dias João se esforça para melhorar e continuar aprendendo. A única coisa que ele ainda não sabe fazer no restaurante é atender no caixa, pela falta de jeito em mexer no computador. Mas ele não corre do desafio, está procurando um curso de informática para se atualizar e afirma estar disposto a aceitar a responsabilidade se for necessário.

Funcionário do mês 2 vezes no ano passado, ele aposta no 3º destaque no mês de Janeiro

Quando questionado sobre as dificuldade de lidar com o público, atividade que exige muita paciência, ele só diz que é como qualquer outro lugar. “As pessoas costumam ter dias bons e ruins”, diz. Entendendo isso, ele não se incomoda nem com os mais mal educados e segue com o trabalho de sempre. Para João, não há função indigna ou tarefa que ele se recuse a fazer, “o importante é a honestidade na hora de conseguir o sustento”.

Mais velho entre os funcionários, ele afirma só ter gratidão pela paciência e respeito dos colegas de trabalho. Homem sério, diz não ter muito tempo para conversa no horário de expediente, por isso as novas amizades ficam só na esfera profissional. Mas entre os outros funcionários, nunca sofreu qualquer tipo de discriminação e sempre teve o esforço reconhecido.

João não pensa em deixar o trabalho enquanto ainda for útil e os únicos planos fora da empresa são referentes aos estudos, que só agora tem a oportunidade de completar. Em 2019, ele começa o 7º ano com ânimo de quem frequenta a escola pela primeira vez e tem a disposição de quem tem sede pelo conhecimento, mostrando que nunca é tarde para recomeçar, independente de todas as dificuldades no caminho.

(Campograndenews)

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