Centrão já administra 73 bilhões de reais no Governo Bolsonaro

Um mês após dar início às negociações com o centrão para se manter no poder e evitar um processo de impeachment, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) já cedeu ao menos quatro cargos de segundo e terceiro escalões, que, juntos, gerenciam cerca de 73 bilhões de reais da União —o equivalente a 2% do Orçamento federal. Todos foram ocupados por afilhados de políticos do Nordeste, região que é majoritariamente administrada por governadores opositores a Bolsonaro e onde ele teve menos votos na eleição de 2018.

Ao mesmo tempo, o presidente ainda negocia a troca de seu líder na Câmara. O atual, Vitor Hugo (PSL-GO), deve ser substituído por um desses três: Ricardo Barros (Progressistas-PR), Hugo Motta (Republicanos-PB) ou João Roma (Republicanos-BA). Conforme o andamento das investigações contra Bolsonaro e a oscilação de sua popularidade, que está em queda nas últimas semanas, mais dois ou três ministérios ainda podem entrar na conta em troca de apoio parlamentar. O centrão está de olho nas pastas de Agricultura, da Infraestrutura e de Ciência, Tecnologia e Comunicações.

Até o momento, os tentáculos do grupo chegaram a cargos secundários nos ministérios da Educação e de Desenvolvimento Regional. Garigham Amarante Pinto foi nomeado para a diretoria de ações educacionais do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). O órgão tem Orçamento de 55 bilhões de reais. Pinto tem como padrinhos o deputado federal Wellington Roberto (PL-PB) e Valdemar Costa Neto, ex-deputado federal, condenado pelo mensalão e eminência parda do PL. Trabalha para a legenda desde 1998, sendo que nos últimos 13 anos chefiou a liderança do partido na Câmara.

Nos próximos dias, Marcelo Lopes da Ponte deverá ser nomeado para a diretoria-geral do FNDE. Ele é chefe de gabinete do presidente do Progressistas, senador Ciro Nogueira (PI). Em princípio, o ministro Abrahan entraub não queria ceder as vagas no MEC. Membro da ala ideológica do Governo Bolsonaro, ele repudiava a participação da “velha política” na gestão. Ouviu do Planalto que ou aceitaria a intervenção presidencial ou seria demitido. Na quarta-feira se encontrou com Ponte para debater como será a entrada dele no FNDE.

Para o Desenvolvimento Regional, que é chefiado pelo ex-deputado Rogério Marinho (PSDB), as nomeações foram de Tiago Pontes de Queiroz na Secretaria Nacional de Mobilidade, Fernando Marcondes Araújo Leão no Departamento Nacional de Obras Contra Seca (DNOCS), e Carlos Fernando Ferreira da Silva Filho na Superintendência de Trens Urbanos do Recife. Apadrinhado pelo líder do Progressistas, Arthur Lira (AL), e por Ciro Nogueira, Queiroz vai administrar um Orçamento de 17,2 bilhões de reais. Leão será o gestor e 1 bilhão de reais e é afilhado de Lira e do deputado Sebastião Oliveira, que é filiado ao PL de Pernambuco, mas está migrando para o Avante. Já Silva Filho, que gerencia 1,1 bilhão, tem como seu padrinho o líder do PSC na Câmara, André Ferreira (PE).

A importância do Centrão

O centrão é um grupo fisiológico que reúne entre 160 e 200 deputados. Praticamente qualquer decisão importante na Câmara depende de seu parecer. Para impedir o andamento de um processo de impeachment ou que a Procuradoria Geral da República denuncie um presidente, por exemplo, são necessários 172 votos. Essa é a importância do agrupamento partidário formado por Republicanos, Progressistas, PL, PTB, PSD e Solidariedade. Alguns membros do DEM, do MDB e de legendas nanicas como PSC e Avante também se alinham ao grupo. Até o ano passado, Bolsonaro dizia que o centrão era seu inimigo. Tratava o grupo como a velha política, antagonista da nova política que dizia ser representada por ele.

Sua atual formatação foi idealizada por Eduardo Cunha (MDB-RJ), o ex-presidente da Câmara que deu entrada no processo de impeachment de Dilma Rousseff e, posteriormente, teve o seu mandato cassado e foi preso por corrupção. Atualmente, o seu principal representante é o líder do Progressistas, Arthur Lira, deputado por Alagoas e investigado na operação Lava Jato, que, desde o início de maio tem atuado como uma espécie de comandante da tropa governista no Legislativo. Nesta semana, entrou em confronto com o líder do MDB, Baleia Rossi (SP), que recebeu convite para indicar apadrinhados, mas ainda não cedeu aos encantos presidenciais.

De todas as legendas representadas pelo grupo, apenas o PSD diz não fazer parte dessa aglomeração. No entanto, conforme membros do partido, não se importa de votar junto com o Governo ou de indicar cargos em um futuro próximo.

Na quinta-feira(21), em entrevista a CNN Brasil, o presidente do PSD e ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, disse encarar com naturalidade a entrega de cargos pelo presidente Bolsonaro. Mas afirma que seu partido é independente. “O presidente, na minha visão, está correto em procurar o Legislativo e construir essa relação, essa maioria, para que o seu Governo tenha governabilidade”.

Bolsonaro, por sua vez, tem defendido as nomeações e afirma que não vê problema em se aproximar de deputados com quem conviveu por décadas na Câmara. Quando indagado sobre a nova aliança, tem dito que, nem sempre, tem como saber qual é o histórico do indicado. Uma fala claramente direcionada para sua militância, que o elegeu com o discurso de que ele era um outsider, apesar de uma longa carreira legislativa.

(El País)

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