Em tempos de intolerância, o jeito é entender o que é respeito com as crianças
Em Campo Grande, no bairro Estrela Dalva I, são cerca de 1,7 mil alunos matriculados, negros, índios, brancos, estudantes com necessidades especiais. Mistura comum na maioria das escolas públicas do País, mas que pode causar conflitos diários, daí a escolha do tema do “Projeto Respeitar”, que expôs no fim de semana as atividades desenvolvidas pelos estudantes.
O ambiente escolar deixa marcas, sejam elas positivas ou negativas, são as primeiras experiências fora do convívio familiar. Em um momento tão importante na formação de crianças, que convivem pela primeira vez com a diversidade, dirigir a olhar ao outro, para reconhecer a diferença é o desafio que a Escola Municipal Consulesa Margarida Maksoud Trad levou para a sala de aula nos últimos 4 meses.
Depois de pesquisar, trocar ideias em sala e se tornarem especialistas no assuno, os alunos do 5º ano se reuniram para escrever um livro inteiro com as “pequenas” situações que muitas vezes passaram despercebidas na própria rotina e na dos colegas, e que só agora eles aprenderam a dar nome e a evitar.
Para a professora de ciências, Karina Stahl Chung Murat, o papel da escola neste momento é de oferecer informação, orientar e colocar em discussão as experiências individuais. “Nessa idade é muito comum que as crianças reproduzam as violências que vivenciam dentro e fora da escola, o que tentamos fazer aqui é identificar a origem desses comportamentos e mostrar que existem outras saídas. A melhor maneira de resistência não é impôr o que é certo para o aluno, é fazer ele perceber que não precisa se tornar o agressor e devolver na mesma moeda”.
Muito do que antes era separado entre racismo, elitismo e discriminação, entre outras violências diárias causadas pela falta de empatia, na rotina das crianças hoje é Bullying, tema muito abordado pela escola em campanhas de prevenção.
“Bullying é você ofender um colega xingando, chamando de gorda, feia, orelhuda e nerd” escreve Emilly ao tentar traduzir de maneira o termo em inglês. “Conheci um menino que sofria Bullying e não avisava os pais, nem ninguém. Sofria muito, às vezes nem comia e nem saia do quarto. Um dia o menino estava triste com o bullying dentro e fora da escola, às vezes voltava com um olho roxo”, relata João Gabriel na tentativa de explicar seu ponto de vista sobre o assunto.
“Bullying é quando uma pessoa é diferente das outras ou nova na escola. A cor é diferente ou é gordo. Ficam rindo, falando que é acima do peso. Ela não quer mais ir à escola”, escreve outro aluno.
Independente de como cada um entende o que é o tal do bullying, que ao pé da letra pode ser traduzindo como “assédio moral”, todos eles sabem que o alvo das zoações dos colegas acaba solitário e muitas vezes com medo de falar. Decisão unanime, a recomendação é sempre o diálogo com um adulto de confiança, pais e professores que estarão sempre ali, como super-heróis para proteger os mais fracos.
Durante as atividades, os professores procuraram trabalhar o respeito ao próprio corpo e ao corpo dos colegas, a aceitação e o amor próprio, como maneira de mostrar que o diferente não é feio e que não há problema nenhum nisso.
Já o respeito é “É você não discordar das coisas que a outra pessoa acredita, como a religião por exemplo e parar de fazer piadas que magoam as pessoas”, explica João Henrique do 7º ano. Em uma idade em que as crianças ainda estão começando a entender os limites das brincadeiras entre colegas e perceber que a graça acaba quando magoa o outro, ter com quem falar sobre o assunto é essencial e função da escola como espaço democrático de acordo com o diretor Orlando Rodrigues Peralta.
Nessa idade, para o Orlando, as experiências vividas fazem parte do processo de formação intelectual e vai impactar diretamente nas escolhas que serão feitas no futuro, é por isso que ao escolher cada subtema foi tão importante incluir não apenas a escola como o entorno, como por exemplo realizar a oficina de Respeito no Trânsito.
“As faixas e placas de sinalização foram refeitas recentemente, a rua aqui em frente vai virar mão única, as mudanças estão sendo feitas para tornar o caminho entre a casa e a escola mais seguros. Para isso também é importante que os alunos entendam o que significa cada um dos símbolos, cores do semáforo e regras de trânsito”. Conta o diretor, que está há 12 anos na escola e viu de perto as mudanças do bairro e o aumento do fluxo de veículos na região.
Em cada exposição, ficou claro que respeito está inclusive nas “menores” coisas e atitudes, como dar bom dia aos colegas de trabalho, ser gentil com a família, usar as “palavras mágicas” que desde cedo aprendemos que fazem parte da boa educação.
Parece clichê, mas é com informação que se combate o preconceito e se desperta a capacidade de se colocar no lugar do outro. Por isso, além das salas sobre bullying, atividades de trânsito, os alunos também falaram sobre respeito a natureza através da reciclagem, respeito a cultura do estado e a cultura indígena, o resgate da empatia, diferenças raciais.
(Fonte: Campograndenews)