Manifestação de bolsonaristas em Recife se refere a mulheres de esquerda como “cadelas”
O refrão dizia: “Dou para CUT pão com mortadela e, para as feministas, ração na tigela. As minas de direita são as top mais belas, enquanto as de esquerda têm mais pelo que cadela”. Apesar do tom preconceituoso e insultante em relação às mulheres, a pedagoga Elissandra Cunha, de 43 anos, presente na passeata, disse não se incomodar.
“O Brasil precisa mudar e ele é a esperança de um país renovado. Sou mulher, sou professora e voto em Bolsonaro. Eu entendo essas acusações de que ele é grosseiro com as mulheres como uma manobra dos outros”, afirmou Elissandra.
A universitária Karen, estudante de geografia na Universidade Federal de Pernambuco, de 22 anos, também no cortejo, declarou que Bolsonaro defende “não só pautas econômicas importantes, mas também morais”. “Ele é contra o aborto, contra a legalização das drogas e eu, como cristã conservadora, defendo isso.”
O seminarista e autônomo Mateus Henrique, de 20 anos, acompanhou Karen na manifestação. Ele julga que Bolsonaro representa “uma ruptura com a ideologia que dominou o país nos últimos anos”.
“Só quem viveu no Brasil nos últimos 14 anos sabe como os partidos de esquerda quebraram o Brasil de uma forma terrível, através da corrupção, na questão financeira e também na área moral. Bolsonaro é um símbolo do conservadorismo voltando à tona. Eu tenho plena certeza que o próprio Bolsonaro não tem a noção da quantidade de pessoas que tinham medo de se posicionar, que tinham uma postura conservadora. Elas ficavam escondidas nas escolas, na faculdade, mas agora saem de casa e mostram orgulho de ser conservador, cristão e patriota acima de todas as coisas”, diz.
Para Mateus Henrique, o ato de campanha entrou para a história. “Eu nunca vi uma manifestação de conservadores dessa dimensão em Pernambuco, isso aqui é histórico. Bolsonaro não é perfeito, tem defeitos, eu discordo dele em algumas coisas, mas ele é tudo o que precisamos nesse momento.”
Bolsonaristas distorcem fatos da ditadura
O técnico em segurança Josevaldo, que também tem um comércio de queijos importados em Recife, diz que se Bolsonaro não fizer um bom governo, caso seja eleito, “a gente põe ele para fora”.
Questionado pela reportagem se não tinha receio de viver sob um governo autoritário, Josevaldo disse que o Brasil “não sofreu uma ditadura”. “Não era isso que o pessoal pinta, o país vivia melhor, tinha um sistema militar e funcionava”, opinou. Sobre os desaparecidos e a tortura ocorrida durante a ditadura (1964-1985), o recifense considerou que reprimir quem faz “baderna” faz parte de “um processo de mudança e acontece em todo canto, inclusive na Europa”.
A negação dos 21 anos de ditadura militar no Brasil e dos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, que concluiu que pelo menos 434 pessoas foram mortas ou desapareceram no período em que o país foi governado por militares, é comum entre simpatizantes de Bolsonaro.
Nas redes sociais, no YouTube e nos grupos de WhatsApp, circulam centenas de montagens de vídeos e fotografias que glorificam os governos militares, ocultam suas consequências e dão ares de normalidade a um regime de exceção. A propaganda fascista circula livremente e vai sendo reproduzida no meio bolsonarista, mesmo entre brasileiros com ensino superior.
A médica dermatologista Ana Emília Dantas Guerra Barreto, de 52 anos, trabalha no ambulatório de hanseníase em um hospital do SUS na capital pernambucana. Ela criticou a decisão tomada pelo PT de não mais utilizar o termo lepra para se referir aos portadores de hanseníase. A medida foi tomada para diminuir o preconceito em torno da doença e estimular os pacientes a buscar tratamento médico.
“A esquerda coloca um outro nome em tudo para camuflar a verdade”, afirma a médica. “A gente vive uma ditadura do PT. Eles foram se infiltrando e aparelhando o Estado”, diz a profissional da saúde. Segundo ela, “é preciso desarticular esta organização criminosa com um contragolpe como aconteceu em 1964, uma contrarrevolução, para resgatar a democracia”.
A caminhada em Boa Viagem foi organizada pelo coronel da reserva Carlos Roberto Souza Costa, ex-colega de Bolsonaro na escola militar. “Em Pernambuco, Bolsonaro cresce a cada dia. Ele já é o candidato que tem maior aceitação depois dos outros da esquerda”, comemorou.
(Andreia Moyses, da RFI)