Paciente conta como a COVID-19 o fez querer ajudar outras pessoas
“Eu comecei a fazer várias reflexões a minha vida. Comecei a imaginar pessoas que não tem oportunidade. Faltando vagas de UTI, pessoas morrendo na intubação, ou por não intubar. Fiz uma lista de propósitos, de gratidão e uma das coisas que pensei é de que iria ajudar pelo menos uma pessoa”.
Foi desta forma que a campanha Respira MS nasceu. Do sentimento de gratidão e inquietude de André Giolo, paciente de COVID-19, administrador, 39 anos, pai de dois filhos pequenos e morador de Dourados. Com a ajuda da esposa e de amigos, ele criou uma campanha solidária para proporcionar o tratamento de suporte ventilatório de Alto Fluxo de Oxigênio, na máquina Cânula Nasal de Alto Fluxo (CNAF). “Essa máquina salvou a minha vida”, disse André, durante a conversa com o Lupanews.
A Respira MS surgiu logo que André teve alta do hospital, em final de maio, e até o momento, já arrecadou cerca de R$ 35 mil e ajudou no tratamento de seis pacientes. De acordo com ele, a campanha continua enquanto as doações estiverem acontecendo. “Em 15 dias, tínhamos arrecadado 20 mil reais. Em um mês foi mais de 30 mil. Primeiro a gente colocou a máquina na UPA, em Dourados. Só ali foram quatro pessoas. Fora da UPA, no Hospital da Vida, um dos casos era muito grave, na UTI, mas ele ainda tinha uma chance e a gente colocou a máquina e deu super certo. Estabilizou, teve alta da UTI, foi para enfermaria, teve alta da CNAF. Hoje apareceu mais um caso de um paciente que tá na UTI, grave, mas que ainda cabe fazer o tratamento de alto fluxo. Enquanto a gente conseguir manter, vamos manter. É isto que me motiva. Além e conseguir salvar, a gente conseguiu trazer respeito, dignidade ao paciente”, avalia.
História
André se contaminou logo após o dia das mães, em maio. Seu estado foi piorando, quando, no dia 20, precisou ser internado, já com os pulmões seriamente comprometidos. Seu quadro necessitava de UTI, mas não havia vaga. “A gente estava se protegendo bastante, levando uma vida bem restrita, mas a maioria das pessoas assumiram um risco. O único lugar que a gente andava sem máscara era com a família. Então esse risco foi assumido e foi aonde me contaminei. Foi justamente no círculo familiar”, conta. Segundo o administrador, seu quadro clínico piorou muito no quarto dia de internamento e seu pulmão chegou a ficar com 80% de comprometimento. “Eu não percebia essa evolução da doença. Quando comecei ouvir falarem em UTI, intubação, fui me preocupando. Quando começou a piorar, a gente começou a pensar em remoção para outro hospital, foi quando ela (a esposa) teve ideia de chamar o Alexandre, ela conhecia o trabalho dele no HU. A hora que entendi a gravidade da situação, eu perdi a noção de verdade, mas graças a Deus foi a hora que o Alexandre chegou”, lembra.
O fisioterapia Alexandre Satoshi Inagaki, citado por André, é Especialista em Terapia Intensiva Adulto há 18 anos, e viu no tratamento com a CNAF uma alternativa viável para pacientes de COVID-19 que ainda poderiam ser poupados de uma intubação ou internamento na UTI. “O André apareceu no período da terceira onda, quando tínhamos um congestionamento das UTIs. Ele vinha de um quadro grave, progredindo com piora. Ele começou a ter indicação total do suporte. Em seis dias conseguimos evitar uma progressão da deficiência respiratória, ele foi manejado na enfermaria e conseguirmos evitar que ele fosse para UTI e que também, fosse intubado”, relata.
De acordo com o fisioterapeuta, grandes centros e hospitais privados já estavam utilizando a CNAF como tratamento contra o Coronavírus. Em Mato Grosso do Sul o uso da máquina ainda não era feito com este fim. Ele explica que mesmo com o custo, relativamente elevado, do aluguel do aparelho, ainda assim, é menor que a diária em uma Unidade de Terapia Intensiva. Através da Respira MS, uma máquina foi disponibilizada para uma Unidade de Pronto Atendimento em Dourados. Quatro pacientes puderam receber o tratamento devido à campanha. Mais duas pessoas receberam o tratamento no Hospital da Vida, uma delas, iniciado semana passada.
Para André, a Campanha Respira MS deve continuar enquanto houver demanda e recursos financeiros para custear o aluguel das máquinas. Mas, ele já pensa em ampliar o atendimento, desta vez para pacientes que necessitam de cuidados pós-COVID-19. “Eu não tinha noção de como seria o pós-covid, da importância da fisioterapia. Eu atribuo três grandes frentes. Primeiro, cuidar do vírus, segundo a cabeça, trabalhar a questão da ansiedade e terceiro é a fisioterapia. Tive alta da fisioterapia 45 dias depois de sair do hospital. Neste período fiquei fazendo fisio. Não só a respiratória. A gente sai do hospital muito debilitado, musculatura atrofiada. Tive dificuldade de segurar meu filho. Não tinha força, tinha que tomar banho sentado, na primeira semana principalmente. Isso porque eu tenho recurso, mas quem precisa da força física para trabalhar? É muito complicado. As pessoas não tem ideia do que é a recuperação depois dessa doença. O projeto me tirou coisas ruins da cabeça. Então eu não dei brecha para início de depressão ou ansiedade. Estamos analisando a possibilidade de oferecer ajuda também para o paciente tenha uma recuperação plena”, analisa.
por Bianca Martins